Bomba relógio na energia elétrica

Bomba relógio na energia elétrica

POR GEORGE VIDOR
Coluna veiculada na edição de 29/7/2014 da revista vespertina digital O Globo a Mais, dirigida a assinantes que a leem em tablets e smartphones:
Tema da minha coluna de ontem (segunda-feira, 28/7/2014) no GLOBO 
impresso e digital, o mercado de energia elétrica merece atenção 
especial porque passa por um momento confuso, com sério risco 
financeiro para as empresas envolvidas no fornecimento. A conta ainda 
não está sendo paga pelo consumidor. Grande parte das empresas tem 
contratos de fornecimento de médio e longo prazos, negociados 
previamente com companhias geradoras ou distribuidoras. Vários também 
geram a própria energia que consomem. Nesses casos, têm um custo 
previsível para a eletricidade e somente ficam expostas a riscos 
quando consomem mais do que o contrato prevê e têm que buscar a 
diferença no mercado de curto prazo. Aí pagam uma fortuna pela 
energia. 
Os consumidores residenciais também estão protegidos dessa variação de 
preços no mercado de curto prazo porque o reajuste das tarifas é 
anual. O salto na conta só ocorreria no mês do reajuste autorizado 
pela agência reguladora, a Aneel. Para amenizar essa trombada futura, 
o governo intermediou com bancos um financiamento para cobrir o 
aumento de custo da energia adquirida pelas distribuidoras. Essas 
empresas distribuidoras terão de pagar esse empréstimo nos próximos 
anos, retransferindo o ônus para o consumidor cativo. 
No entanto, acredita-se que a partir do ano que vem ou em 2016 o custo 
da energia diminuirá, especialmente se o regime de chuvas se 
normalizar. De qualquer forma, alguma redução haverá quando 
companhias estaduais geradoras (Cemig, Cesp e Copel) devolverem ao 
governo federal várias concessão de hidrelétricas. Tais companhias não 
quiseram renovar as concessões nas condições oferecidas pelo governo. 
Então haverá uma leilão para ver quem se interessa por gerenciar as 
hidrelétricas dentro de parâmetros que as autoridades vão ainda 
definir, mas cujo preço da energia certamente será bem abaixo dos que 
vigoram hoje no mercado. 
Como a energia procedente dessas usinas ficará mais barata, na média o 
custo da eletricidade tende a se reduzir a partir de 2015, de maneira 
que o reajuste nas tarifas dos consumidores não precisará ser tão alto 
para os consumidores com objetivo de se quitar o tal financiamento. 
O problema atual está então dentro do próprio setor elétrico. O que 
geradoras (inclusive de hidrelétricas) estão tendo de pagar no mercado 
de curto prazo para cumprir seus contratos de fornecimento é uma 
equação que não fecha. Como elas não conseguem gerar (porque os 
reservatórios estão baixos ou porque, no caso das termoelétricas, 
foram forçadas a operar mais que deviam e agora param para manutenção 
fora das datas previstas) a quantidade de eletricidade a que se 
comprometeram, têm de comprar essa diferença no mercado de curto 
prazo. Os preços estão tão distorcidos que há grandes consumidores 
parando suas linhas de produção para oferecer no mercado de curto 
prazo a energia que contrataram previamente. Existe um racionamento 
voluntário por parte das indústrias eletrointensivas (e talvez por 
isso não tenha havido necessidade de o governo decretar um 
racionamento formal). 
Ninguém sabe o que fazer para resolver essa questão, porque tudo 
cheira a quebra de contrato. Enquanto isso se multiplicam ações na 
justiça por parte de companhias geradoras, que alegam não ter como 
pagar os preços que são obrigadas a pagar no mercado de curto prazo 
quando têm de adquirir energia em decorrência de decisões alheias à 
vontade das empresas. Isso pode virar uma bomba relógio.

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