De volta à Lusitânia (final)

De volta à Lusitânia (final)

POR GEORGE VIDOR
O Algarve como um todo vive basicamente do turismo, mas a pesca ainda é uma atividade relevante por lá. Sagres tem o porto da Baleia (o esqueleto de uma"decora" o cais), do qual saem os barcos de pesca para enfrentar o Mar Tenebroso. Nesse lado Sul de Portugal o mar até que é bem calmo, praticamente sem ondas. O Tenebroso, como chamavam os antigos navegantes, deve ser o meio do Atlântico. Em Albufeira cheguei a dar um mergulho relâmpago, pois a água estava a dezesseis graus centígrados. A dez quilômetros de Sagres está o Cabo de São Vicente assim chamado porque os restos mortais do santo teriam sido sepultados ali (mais tarde foram levados para Lisboa). Uma das obras mais interessantes do acervo do Museu de Arte Antiga (rua das Janelas Verdes) em Lisboa é exatamente o quadro - com várias telas - sobre a Devoção a São Vicente. A pintura é do século XIV e nela estão retratados alguns personagens da época, como o Infante D. Henrique, e supostamente o próprio pintor. A imagem medieval que costumamos ver do Infante é extraída desse quadro. A dez quilômetros de Sagres está o Cabo de São Vicente, onde o continente europeu acaba, dizem eles. É o calcanhar de Portugal e um dos três pontos mais visitados do país. De um lado do cabo, mar tranquilo; do outro, os ventos ajudam a formar ondas e em direção a Lisboa surgem as primeiras praias freqüentadas por surfistas. Retornando para Lisboa seguimos um pouco pela estrada que vai pelo litoral, mas antes de deixar o Algarve cometi um erro. Resolvi pegar a estrada que leva a Monchique. Foi perda de tempo. Embora de lá se veja praticamete todo o Algarve, é um tanto distante e o visual não chega a ser imperdível (o ponto culminante se chama Fóia, que abriga um radar da força aérea portuguesa, antenas de TV e telecomunicações, além de um restaurante pouco convidativo). A estrada é maçante e sinuosa, e no rumo a Lisboa passa-se por um longo trecho pouco atraente do baixo Alentejo. Fomos dormir na pousada de D. Afonso, em Alcácer do Sal, quase no estuário do Rio Sado. A pousada fica no alto da cidade, em um antigo convento cercado por muralhas medievais. É uma das pousadas mais interessantes. Como em Portugal se come muito bem, causa uma certa frustração quando os pratos não estão uma maravilha, e foi o que aconteceu conosco no restaurante da pousada. Deve ter sido falta de sorte, pois no estuário do rio Sado a gastronomia é conceituada. Em Comporta, pequena cidade próxima a Alcácer do Sal, os restaurantes de peixe costumam atrair gente vinda de Lisboa. A estada em Alcácer do Sal foi mesmo uma pequena parada para jantar e dormir. No dia seguinte partimos para Palmela, cinquenta quilômetros à frente. A Pousada de Palmela foi reformada recentemente e é uma atração especial, pois está instalada em um convento de mais de quinhentos anos, junto a um castelo que tem quase mil. O fundador e primeiro rei de Portugal, D Afonso Henriques, conquistou esse castelo lutando contra os mouros, que o retomaram anos depois. Mouros e portugueses foram assim se revezando na posse desse castelo. É muita História. Como fica bem no alto de um morro, pode-se ver de lá Lisboa em dia claro. A vista para Setubal e para o estuário do Sado também é bonita. Como já havia estado nessa pousada, tentei ficar na de Setubal, que fica dentro de um forte. Mas ela é pequena (só tem dezesseis quartos) e estava completa. Mas acabou sendo bom ter ficado em Palmela, pois demos um passeio pela Serra da Arrábida (passamos por Azeitão, fomos até o cabo do Peniche, e almoçamos no Portinho da Arrábida, no restaurante O Farol : uma caldeirada de robalo, das boas, com rocambole de laranja e amêndoas, inesquecível; comida ótima e preços melhores ainda). Voltamos por Setubal, cidade portuária e que pode ser visitada rapidamente. Uma semana de viagem, e já era hora de ir para Lisboa, onde fui convidado para participar de um seminário sobre a economia brasileira. Lisboa virou uma metrópole que melhora a olhos vistos. No pouco tempo que tínhamos disponível preenchemos algumas lacunas, como a visita ao Museu de Arte Antiga. Foi bom também rever o Mosteiro dos Jerônimos (onde estão sepultados Vasco da Gama, Camões, Fernando Pessoa e o rei D. Manuel, o Venturoso) e aproveitar para saborear os famosos pastéis de Belém. Na noite anterior ao seminário fomos jantar na Tasca da Adelaide (indicação do nosso ex-embaixador em Portugal José Gregori, que foi moderador do painel que participei, junto com o secretário Marcos Lisboa, o ex-ministro Pedro Malan e meu colega Merval Pereira), na região da Estrela, próxima à sede do governo português. Comi uma paleta de borrego, ótima, seguindo a indicação do maitre/garçon. No dia do seminário, os organizadores promoveram um jantar em homenagem ao presidente Fernando Henrique Cardoso no belo Palácio Nacional da Ajuda (hoje um museu usado também para recepções), com a presença do ex-presidente português Mário Soares.

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