A praia vai virar sertão?

A praia vai virar sertão?

Jornal do BrasilGEORGE VIDOR* 
O Brasil continuará dividido após as eleições de outubro, e é sobre isso que precisamos meditar. Como governar uma nação cheia de problemas com metade do eleitorado achando uma coisa, e a outra metade pensando de maneira oposta? Não é prerrogativa do povo brasileiro ir atrás de líderes carismáticos e messiânicos. Desde os tempos bíblicos esperamos pelo messias, e ainda há uma controvérsia se já passou por esse mundo ou não.
Por via das dúvidas, aqui no Brasil estamos sempre atrás de algum Antônio Conselheiro. O risco que existe é de tudo virar uma Canudos e acabar em tragédia. Mas até o arraial do Conselheiro um dia se reergueu das cinzas, não no mesmo local, pois ali foi construída uma barragem. E “o sertão virou praia”, como ele profetizava. Mas “a praia não virou sertão”.
Os candidatos sem carisma não tiveram chance nessas eleições. À frente das pesquisas estiveram os mais messiânicos. Jair Bolsonaro já nasceu com Messias no próprio nome. E Haddad é um messias Frankenstein, pois é cover do idolatrado Luiz Inácio Lula da Silva (que vez por outra se apresenta como um novo Conselheiro). Se for vitorioso nas urnas, será um presidente ventríloquo? O terceiro colocado nas pesquisas, Ciro Gomes também entra na lista dos mais messiânicos. Garante que no segundo ano de seu governo a economia voltará a crescer a um ritmo de 5% ao ano...
Deus nos acuda!
Não, não, não estou tão pessimista quanto possa parecer. Na verdade, concordo com os mercados. Os dilemas políticos atrapalham, mas não impedirão que a economia siga um rumo de recuperação lenta e gradual no ano que vem. Retiradas algumas amarras e desatados poucos nós, poderemos crescer em torno de 3,5%, com uma inflação comportada (entendendo-se como tal algo abaixo de 5% a.a.), com taxas de juros ainda inferiores a dois dígitos. O câmbio pode empurrar as exportações para o patamar de US$ 250 bilhões, e assim continuarem com um saldo na balança comercial da ordem de US$ 50 bilhões, o suficiente para não passarmos apertos no mercado financeiro internacional.
A safra de governadores que vem por aí pode dar uma boa melhorada em relação à atual. Esperamos que a Câmara dos Deputados tenha uma oxigenada. Não é otimismo exagerado apostar em uma bancada suprapartidária de pelo menos 80 deputados empenhados em batalhar pelas reformas que o Brasil de fato precisa para avançar, além de inibir as maluquices que vierem do Palácio do Planalto. No Senado, a bancada esportista vai se ampliando, mas não é de lá que geralmente emergem grandes confusões na política.
O que a maioria dos brasileiros almeja é paz e tranquilidade. Sair por aí sem medo de uma bala perdida, de um revólver, faca ou canivete no cangote, sem assalto aos cofres públicos, sem arrastões. E com abertura de oportunidades para realizar alguns sonhos.
* Jornalista – Em “Os sertões” Euclides da Cunha conseguiu reproduzir algumas palavras do Conselheiro, a partir de depoimentos de sobreviventes do massacre de Canudos. Usualmente nos referimos a essas palavras como “o sertão vai virar mar,...”, mas Euclides citou “praia”, em vez de “mar”.