Prejuízo incalculável

Prejuízo incalculável


Jornal do BrasilGEORGE VIDOR*

Muito difícil calcular o que o país perdeu com a greve/locaute dos caminhoneiros. As estimativas se baseiam nos prejuízos de produtores de alimentos perecíveis. Mas é incalculável a perda decorrente do que deixou de ser consumido, como um todo, no período em que o transporte foi quase totalmente paralisado pelos bloqueios e pela falta de combustíveis. Perdeu-se uma significativa parcela de arrecadação pelo que não foi consumido etc. etc. etc.
A economia moderna funciona no modelo “just in time”. Ninguém fica carregando imensos estoques. As linhas de produção se encadeiam umas às outras em tempo real, o que reduz custos e traz benefícios para todos os que produzem e consomem. Um processo que neutraliza movimentos especulativos, tão comuns em outras eras da economia.
Os transportes são um elo importante dessa cadeia produtiva. Ninguém tem dúvida disso. A preocupação com a segurança dos caminhoneiros é uma questão que deveria merecer mais atenção da sociedade. Para sobreviver, muitos arriscam a própria vida e a dos demais usuários das rodovias, drogando-se para se manter acordados enquanto dirigirem horas e horas a fio. Não é a mistura de refrigerante com café que os mantém acordados. É o uso de anfetaminas e outras drogas (legais e ilegais). Não por acaso cerca de 25% dos motoristas habilitados deixaram de fazer o exame toxicológico, agora obrigatório no Brasil (o exame detecta qualquer uso de droga ao longo dos seis meses anteriores). Aproximadamente 70% dos acidentes com morte nas rodovias brasileiras envolvem caminhões.
Quem dirige caminhão é um perito no volante. Quando um caminhão tomba em alguma curva não é porque o motorista dirige mal. Ele perde o controle do veículo por falta de reflexos. Qualquer um de nós perde parte dos reflexos quando bebe, usa drogas ou está exausto ao volante.
Os transportadores merecem, portanto, melhor tratamento e mais consideração do restante da sociedade. Todavia, ainda que suas reivindicações sejam justas, não podem simplesmente causar uma perda incalculável ao país. Se desorganizam a produção, como aconteceu, dão um tiro no pé. Do ponto de vista econômico, o movimento foi uma asneira. Prejudicaram também a si próprios. O que deixaram de faturar talvez supere os benefícios que vão receber. Do ponto de vista político, saíram vitoriosos, pois o governo apatetado ficou sem alternativa a não ser ceder às reivindicações, sob o risco de o Brasil entrar rapidamente em colapso. Mas havia o risco de algum comandante enfezado rosnar em um lugar qualquer do país e isso se espalhar como um rastilho de pólvora. Já dizia Winston Churchill que a democracia é o pior regime político com exceção de todos os outros. As opções que estão sendo postas à mesa são todos os outros.
A Petrobras é a maior culpada dessa confusão? Mais ou menos. Talvez a empresa tivesse que buscar uma política de preços para o óleo diesel que proporcionasse um horizonte para os transportadores. A empresa tem perdido mercado na venda de derivados de petróleo e isso significa que sua política de preços provavelmente anda fora do prumo.
No entanto deve ficar fora de cogitação a companhia vir a subsidiar qualquer derivado; se tem prejuízo por razões de mercado, paciência, faz parte da regra do jogo. Mas se subsidia por decisão governamental não haverá mais quem queira se tornar parceiro das refinarias (na proporção de 40% do capital), investir em novas unidades ou comprar suas ações em bolsa. E isso será mais uma perda para o Brasil, pois precisaremos importar volumes crescentes de derivados, e aí sim a preços internacionais que oscilam diariamente.
O Brasil está passando por uma fase de “emburrecimento” coletivo. Um fenômeno a ser estudado por mentes brilhantes. As coisas têm andado como se ninguém estivesse mais pensando, e sim reagindo por reflexo. Pena que Pavlov não está por aqui para nos submeter a estudos aprofundados. Ganharíamos um dinheirinho como objeto de pesquisa.
* O jornalista às vezes brinca com assunto sério para aliviar suas tensões e preocupações com o país que ama

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