Comemoremos

Comemoremos

POR GEORGE VIDOR
A queda das taxas de juros traz outros benefícios que não são ta]ao visíveis para a sociedade
Por muito tempo o governo preferiu propagandear a evolução da dívida pública líquida, tirando o foco do endividamento total, mais usado como um dos indicadores da saúde financeira de uma economia. Isso porque o Banco Central acumulou um grande volume de reservas em moeda estrangeira, na época que o real estava supervalorizado. Em tese, essas reservas correspondem a créditos que o país tem, descontáveis do endividamento total para se chegar à chamada dívida líquida. Nada de errado com isso, pois as reservas realmente existem. O Banco Central comprou as divisas entregando ao mercado títulos emitidos pelo Tesouro.
A manutenção das reservas tem um custo, que é a diferença entre o que o Banco Central recebe aplicando os recursos lá fora (títulos do Tesouro americano, em boa parte) e o que o Tesouro paga a mais internamente pelos papéis emitidos aqui. Tal custo vai diminuindo à medida que as taxas básicas de juros caem no Brasil. Além de outros subsídios custeados pelo Tesouro Nacional em operações semelhantes, como os aportes feitos no BNDES.
São ganhos expressivos, mas pouco visíveis para a sociedade. Por isso, cada ponto de redução das taxas básicas de juros – como acontecerá na reunião do Comitê de Política Monetária nesta quarta-feira -  é motivo de celebração.
Nem 8, nem 80
Este mês começam as rodadas de licitações de blocos para exploração e produção de petróleo, que deverão dar novo ânimo ao setor. Os tempos de euforia passaram, pois nem um míssil norte-coreano sobrevoando território saudita será capaz de elevar novamente o preço do barril para a faixa de US$ 100. É provável que o petróleo encontre um ponto de equilíbrio em torno de US$ 65 no futuro, mas em um horizonte ainda imprevisível. Então, o setor terá que se contentar com US$ 50, e lamber os beiços.
Nesse cenário, políticas públicas de atração de investimentos têm sido revistas. O Brasil fez isso, desobrigando a Petrobras de cumprir um monte de maluquices engendradas nos governos Lula e Dilma.  A estatal jamais perderá a posição de força motriz da indústria do petróleo no Brasil. Pelo acervo que acumulou e pela capacidade de abrir novas frentes. Porém é mais do que saudável que se multipliquem os atores nesse cenário, para o bem de todos, inclusive da Petrobras, pois a competição é estimulante, alimenta a inovação e obriga a quem está na dianteira a melhorar.
O petróleo é uma matéria prima que, em estado bruto, não serve para nada. Processado, tem infinitas aplicações, Até mesmo sob a forma de medicamentos. A exploração de hidrocarbonetos em águas ultra profundas, e a cinco mil metros abaixo do fundo do mar, como é o caso do Brasil, é um desafio que envolve não apenas empresas especializadas, mas até mesmo quem se ocupa da logística (cama e mesa) daqueles que ficam entrincheirados nas plataformas por semanas a fio.
Tirar proveito disso faz parte de políticas públicas, seja aqui ou na Noruega. Por isso, instituiu-se exigências de conteúdo local para a contratação de serviços e equipamentos para as operadoras de campos de petróleo no Brasil. Mas os exageros chegaram a inviabilizar investimentos, daí ter sido necessária uma revisão das normas que vigoravam no país. Podiam ser toleradas em um contexto de barril a US$ 100, mas não a US$ 50.
A revisão simplificou essas normas, que antes se preocupavam até com os parafusos utilizados. A política anterior era uma espécie de "me engana que eu gosto". Não foram poucos os fracassos e frustrações, mas há também muitos casos de sucesso. A Techint entregará a P-76 (construída e montada no Paraná, em um canteiro em frente à paradisíaca Ilha do Mel) em 2018, dentro do prazo. O índice de conteúdo local contratado era de 65%, e chegará a de fato a 82% na construção, e a 94% na integração de módulos. A indústria como um todo não foi tão bem na construção dos cascos das plataformas, mas na fabricação e integração de módulos (que envolve mais inteligência que trabalho braçal) os resultados foram animadores. A P-76 vai para campos que a Petrobras recebeu do governo em cessão onerosa na Bacia de Santos. Outras duas seriam construídas aqui, mas foram para a China
A Petrobras agora não contrata mais diretamente novas plataformas. Elas são afretadas de terceiros, que se responsabilizam pela construção. Isso, de fato, deve baratear os equipamentos para a empresa. Para acompanhar as construções, a Petrobras costuma mandar uma legião de funcionários fiscalizá-las, e ainda assim deu no que deu. Em outras companhias, esse número se restringe a duas dezenas de fiscais.
Como o momento é de se consertar as aberrações, equívocos podem ser cometidos. Recentemente a Petrobras pediu um orçamento a uma companhia, instalada em Niterói, para o fornecimento de correntes de aço usadas na ancoragem de plataformas. A exigência é que na fabricação o aço fosse brasileiro. Pediu simultaneamente cotação a uma empresa chinesa, sem exigências. Os chineses conseguiram oferecer um preço 10% mais barato. Só que, sem exigências, a empresa brasileira poderia fornecer as amarras com uma redução de 15%. Virou uma confusão, pois como a Petrobras é dependente de financiamentos chineses, indiretamente está se obrigando a contratar lá. O que acontecerá com a empresa brasileira? Fechará o canteiro, provavelmente dispensando 200 pessoas treinadas e gabaritadas.
A solução para isso é bom senso, nada mais.

Comentários