Pólvora redescoberta

Pólvora redescoberta

POR GEORGE VIDOR
Juros altos mantidos por longo tempo são um tiro no pé
Amador Aguiar, lendário presidente do Bradesco, dizia que para eles o ambiente econômico de taxas de juros mais baixas era melhor. Uma vez, em uma cerimônia na Academia Brasileira de Letras, já naquela idade em que a autocensura nas palavras começa a desaparecer, ouvi dele que chegara a esse tipo de conclusão sem ter lido um livro de economia. De fato, as evidências mostram que nem é preciso recorrer à teoria econômica para se constatar que taxas de juros demasiadamente altas, se mantidas por longo tempo, anulam grande parte do objetivo que se deseja atingir, devido aos efeitos colaterais (crescimento exponencial da dívida pública e inviabilização de investimentos, por exemplo). Agora o economista André Lara Resende, respeitado por seus pares – porque suas críticas não têm aquele viés ideológico de achar que política monetária calcada em juros altos é uma conspiração político-mafiosa com único intuito de enriquecer ainda mais os poderosos banqueiros – afirma que juros altos causa, inflação, se mantidos por muito tempo. Ou seja, tiro pela culatra.
Redescoberta a pólvora, o Banco Central conseguirá ajustar a política monetária nos próximos meses sem que uma tormenta de críticas desabonadoras desabe sobre a cabeça de seus dirigentes.  Claro que a condição "sine qua non" para isso acontecer é que os demais gastos estejam sob controle, de forma compatível com as receitas. Nesse sentido, o Brasil vem dando passos importantes (PEC 51, reforma da previdência, etc.).
Pegou mal
Pedro Parente comprou uma briga desnecessária com a engenharia brasileira, ao desqualifica-la completamente no convite feito a 35 empresas do exterior para concluir as obras da futura UPGN (Unidade de Processamento de Gás Natural) do Comperj. Praticamente todas as grandes empreiteiras brasileiras estão envolvidas na operação Lava Jato e depois de todo esse enorme escândalo de corrupção a Petrobras precisa ser mesmo cautelosa nas suas parcerias. No entanto, a empresa tem um longo histórico de envolvimento com a engenharia brasileira. Não foi por acaso que a proximidade com o Cenpes (Centro de Pesquisas da Petrobras) atraiu várias companhias estrangeiras importantes para o parque tecnológico da UFRJ na Ilha do Fundão. Esse convívio longevo permite que a estatal consiga separar o joio do trigo. No Brasil há um monte de empresas capacitadas, nacionais e estrangeiras, que conhecem tudo por aqui. E a Petrobras não consiga selecionar uma só que seja?
Trata-se de um contrato da ordem de R$ 2 bilhões, ainda mais relevante em uma economia anda devagar. A empresa que for selecionada lá fora terá de necessariamente contratar brasileiros para pegar no pesado. E precisará da ajuda de alguém aqui para encontrar Itaboraí no mapa. Porém, é pouco provável que deem sequer atenção à engenharia brasileira na execução dos serviços. Se forem os chineses, então...
A Petrobras, como operadora de Libra, no pré-sal da Bacia de Santos, já tinha causado profundo mal-estar em toda a indústria ao pedir à ANP (Agência Nacional do Petróleo) dispensa do conteúdo local – cuja percentagem mínima foi estabelecida previamente no leilão do bloco – na contratação da primeira plataforma de produção do campo.
Todas as grandes petrolíferas no mundo atraem cadeias de fornecedores, por interesse próprio. O Brasil tem muitos fatores que dificultam a competividade da indústria, o que é notório. Mas não é verdade que sejamos 100% ineficientes, caso contrário e a Petrobras também teria de ser incluída nesse bolo, e a atual diretoria da Petrobras vem tentando provar justamente o contrário.
Parente desta vez pisou na bola e deveria incluir empresas aqui instaladas, nacionais ou estrangeiras, no convite para conclusão da UPGN do Comperj. Que, por sinal, não é um bicho de sete cabeças, pois há várias outras unidades desse tipo funcionando no país.
Sorte?
No mundo dos cosméticos empresas gigantes dividem espaço com outras bem pequenas (que vão crescendo e geralmente são "engolidas" pelas gigantes, a exemplo do que aconteceu com a Nielly no Brasil, comprada pela francesa L'Oreal). Além de preço, o que permite essa divisão é a aposta na qualidade e em produtos inovadores. Dione Vasconcellos começou fazendo sabonete na cozinha de casa. Produzia para uma rede sofisticada de lojas. Por dois anos seguidos, na época do natal, abriu um quiosque em um famoso shopping na Barra da Tijuca e teve enorme sucesso de vendas. Aventurou-se então na compra de uma modesta fábrica em Jacarepaguá, pendura em dívida. Propôs um acordo com o principal para pagar em dois anos, mas já sexto mês havia liquidado o débito. Isso em razão da sua Lola Cosmetics, com uma linha de produtos que ela rotula como vegana, sem presença de insumos de origem animal. Dione também inovou nos nomes dos produtos ("Morte Súbita", "Meu Cacho Minha Vida", etc) e nas embalagens – uma máscara hidratante parece um pote de sorvete. Na vida há que se ter sorte, mas não basta: para se ter êxito empresarial é preciso pôr a cabeça para funcionar.
PS - A Petrobras respondeu ontem às críticas à exclusão da engenharia brasileira na retomada das obras da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN). Prestou esclarecimentos, como se espera de uma empresa da importância da Petrobras. Mas a nota afirma que os argumetnos das críticas são simplistas...o que dizer?

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