Fruto da imaginação, mas...

Fruto da imaginação, mas...

POR GEORGE VIDOR
De certa maneira, o “dinheiro” é fruto da imaginação, mas seu valor acaba sendo definido pelo mundo real
A não ser a própria Casa da Moeda, ninguém produz “dinheiro”. As economias produzem bens e serviços, e trocam “excedentes”. A moeda é uma criação prática, resultado da nossa própria imaginação, para facilitar os sistemas de troca e de acumulação de riquezas. Se é simples resultado da nossa imaginação, como o valor da moeda é então definido (já que nem valor intrínseco tem mais, pois a maior parte da moeda é virtual)? Obviamente que existe uma relação com o mundo real da produção e com o fluxo de capitais decorrentes da troca de bens e serviços, e de operações financeiras relacionadas com essa produção.
No entanto, parte considerável desse fluxo financeiro está relacionado com credibilidade. Que, por sua vez, depende de políticas públicas, pois, em qualquer economia, o setor público é sempre o mais poderoso agente econômico (até porque tem o poder de agir diretamente sobre a moeda, emitindo-a ou enxugando-a, e o crédito). As políticas públicas estão na fase de reconquistar a credibilidade. Até aqui, mesmo com os embaraços na política propriamente dita, o governo Temer tem obtido êxito nessa reconquista. Sem isso, a economia brasileira não conseguirá andar para frente em 2017. Não temos outra opção. Até porque a moeda, no fundo, é mesmo fruto da nossa imaginação.  
Tapete vermelho
Economistas não precisam fazer estágio em um botequim da esquina para se graduar ou pós-graduar. Quase sempre se baseiam em experiências do passado para desenvolver teorias ou construir modelos que facilitem a análise e a projeção sobre o futuro. Conjugando estatísticas, constroem modelos em que alguns fatores podem determinar como o restante deve se comportar. De fato, as economias seguem princípios básicos, que definem certas leis. Ninguém em sã consciência é capaz de questionar a lei da oferta e da procura, embora sejam muitas as discordâncias e haja diferentes pontos de vista sobre como interferir em uma ou em outra, de modo a superar o maior desafio que os economistas enfrentam: a escassez.
Os sistemas econômicos se tornaram mais complexos e às vezes esbarram em peculiaridades que põem em xeque certas verdades. Há tempos existe uma discussão no Brasil sobre o impacto das taxas de juros no conjunto da economia. Devido a décadas de inflação crônica e aguda, uma indexação de preços e salários sui generis e “otras cositas mas”, a estabilidade monetária que se buscou após o Plano Real foi calcada em taxas de juros demasiadamente altas. Talvez não houvesse mesmo remédio alternativo.
É uma terapia que traz efeitos colaterais perversos, que acabam anulando grande parte do objetivo que se tenta alcançar, se mantida eternamente. O debate em torno disso acaba se misturando com o embate político-ideológico que costuma mover a sociedade brasileira. De um lado, os que enxergam na persistência dessa terapia uma trama arquitetada por interesses poderosos, sempre com os banqueiros e especuladores vampirescos nos bastidores. De outro, aqueles que só enxergam uma equação. Ou uma função e suas respectivas derivadas (caindo na matemática). Para o botequim da esquina, tudo isso é surreal. 
Mas ás vezes surge uma luz no fim do túnel. André Lara Resende, que tem o respeito de seus pares, resolveu pôr o dedo nessa ferida, em dois artigos publicado no Valor Econômico, jornal primo-irmão do GLOBO. Meio no estilo “o rei está nu”, André se alinha aos que consideram como um tiro no pé a manutenção de taxas de juros demasiadamente altas ao longo do tempo. Sobram evidências práticas em relação a isso, mas em um arcabouço teórico e acadêmico, a discussão resvala novamente para o primitivo debate político-ideológico. Então, esses dois artigos são merecedores de tapete vermelho, pois ajudam a trazer a discussão para o terreno apropriado. Consertar as finanças públicas, em tudo o que isso envolve, é hoje o cerne da questão.
Nem 8, nem 80
No bojo das reformas andamento, o Conselho Nacional de Política Energética deve definir regras que as operadoras de campos de petróleo (sob concessão ou regime de partilha) deverão cumprir. As regras rígidas estabelecidas a partir de 2005 não deram o resultado esperado. Serviram mais para encarecer e inviabilizar investimentos no setor de petróleo, do que para dar competitividade à indústria nacional. Mas também não se pode desperdiçar uma oportunidade única de se criar uma cadeia de fornecedores para o petróleo. É necessário para as próprias operadoras.
 Nas regras de 2005 chegou-se ao exagero de se definir percentagens de conteúdo local mínimo em 60 subitens das encomendas das operadoras de petróleo. Nessa composição, foram favorecidos também aqueles que nem se mexem para se tornar competitivos, pois ganharam uma espécie de mercado. Na revisão das regras, o CNPE tende a dar mais flexibilidade a essa política. Talvez até elimine o percentual mínimo exigido de conteúdo, deixando que os leilões definam o mais adequado. Antes da obrigatoriedade, os investimentos da Petrobras já tinham naturalmente de 35% a 40% de conteúdo local. Agora já é possível ir além, mas pela via de mercado. No mundo do petróleo, a política brasileira de conteúdo local é hoje classificada como a pior.  

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