Desolador

Desolador

POR GEORGE VIDOR
Somado à corrupção, os cofres públicos são assaltados por sonegadores e toda a sorte de bandidos que tornariam Al Capone um amador
A fonte principal de arrecadação de todos os estados brasileiros, sem exceção, são os combustíveis. Em São Paulo, por exemplo, representam 16% do total do ICMS arrecadado. O segundo item é a energia elétrica, com 8%. Os impostos sobre combustíveis são elevados, o que atraiu para essa atividade sonegadores contumazes, que abrem e fecham empresas antes que a justiça dê ganho de causa ao fisco. O débito se torna irrecuperável porque o sonegador se apoia nesse meio tempo em liminares que lhe permitem não recolher imposto sem ser obrigado a depositar em juízo o valor que está contestando.
No litro da gasolina, há R$ 2,22 em impostos; as alíquotas de ICMS, que é o tributo mais pesado, giram em torno de 30%. A sonegação se dá de várias formas. Al Capone, o gangster mais famoso da história, que fez fama em Chicago na época da Lei Seca nos Estados Unidos, ia se sentir um amador. Há esquemas mais sofisticados, como o de empresas que se escoram na vulnerabilidade da legislação e na lentidão do judiciário, até aqueles que se arriscam a passar pelas barreiras das secretarias de fazenda com caminhões cheios de combustíveis sem qualquer nota fiscal. Se um é apanhado, vários outros passam, e o lucro compensa largamente o prejuízo com a mercadoria que for aprendida. Existe o esquema cara de pau, quando o motorista alega ter esquecido a nota fiscal, e fica aguardando um motoqueiro leva-la, com a emissão após o flagrante.
Não é à toa que postos de serviços têm sido usado como instrumento de lavagem de dinheiro por quadrilhas barras pesadas de narcotráfico, contrabando, roubos de carga. Tramita no Senado um projeto para fechar o cerco aos sonegadores, mas nessas coisas o Congresso sempre anda a passos de cágado. E diante de uma crise fiscal colossal dos estados, municípios e da própria União, é inconcebível que os governantes sejam lerdos na busca de uma solução.
Soma-se a isso agora uma nova modalidade de furto no Brasil, a de petróleo bruto. No México, esse tipo de crime virou uma epidemia.  E agora aqui já foram registrados 20 casos. O alvo é sempre o petróleo leve extraído da Bacia de Santos. São atacados dutos em trajetos nos quais não se consegue detectar de imediato a retirada do óleo. Os dutos são perfurados com equipamentos sem causar explosão ou derramamento de óleo. O petróleo leve pode ser refinado em destilarias rudimentares ou então é simplesmente queimado em certos processos industriais. Os ladrões têm clientela certa.
A delinquência deixou de ser marginal para se envolver em negócios formais lucrativos e de aparência legal. É caso de calamidade pública.
 Termômetro da barbárie
  • Supermercados próximos a zonas conflagradas do Rio registram queda no movimento. Moradores evitam sair à noite, a partir das 18 horas, horário em que muitos faziam compras antes, depois da volta ao trabalho. Mesmo tendo que pagar mais pelas mercadorias, as famílias acuadas preferem se abastecer em mercadinhos vizinhos às suas casas. Quanto mais perto de casa, melhor.
  • O crescimento de favelas sempre preocupa porque são territórios que estão fora de controle e são dominados por quadrilhas de narcotraficante, roubos de carga, milicianos, piratas de sinais por TV assinatura, etc. Em uma área onde existia uma fábrica que chegou a ser nome de sucesso no mercado de carteiras, cintos e artefatos de couro, a Kelson's, há hoje uma grande favela, que margeia a baía de Guanabara e a Avenida Brasil. Vizinha a ela está o Mercado São Sebastião, conhecido por abrigar atacadistas de bens de consumo, especialmente alimentos. A favela já encostou literalmente no Mercado. Ladrões entram pelos telhados dos galpões, descem de rapel (modalidade que antes era uma diversão de alpinista, gente que gosta de adrenalina no sangue, ou um recurso usado por bombeiros apara salvamentos em locais de difícil acesso), e sobem pela corda as mercadorias furtadas. As empresas estão fugindo de lá, até porque os caminhões que entram e saem são também alvos dos ladrões de carga. Nesse ritmo, não vai durar muito para o Mercado virar uma extensão da favela Kelson's, o que é apavorante.
Nem tudo é desalento
Motivos não faltam para o clima de desalento que se abateu sobre as pessoas de bem no país. Mas há quem continue enxergando oportunidades nesse imenso Brasil, sem ter que recorrer ao banditismo. O grupo Accor, um dos maiores gestores de redes hoteleiras no mundo, assumiu 30 hotéis da BHG, sendo quatro no Rio Renovou o antigo Cesar Park na Praia de Ipanema, que em poucos dias ganhará a marca Sofitel na fachada principal.  O hotel se propõe a atrair moradores e frequentadores de Ipanema para sua cafeteria, tendo com chamariz doces e pães no estilo francês. Em obras, o decano Sofitel Copacabana reabrirá em 2019 como um cinco estrelas com a marca Fairmont. É animador, considerando-se que a recessão fez um grande estrago no ramo de bares e restaurantes no Rio. Fecharam mais de cem nos últimos anos.

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